sexta-feira, 14 de junho de 2013

O Caos nosso de cada dia

É sexta-feira, dia em que geralmente a rua está agitada, há música no ar, cadeiras no bares, pessoal conversando, uma alegria pelo fim da semana de labuta, a pequena alegria cotidiana de tantos cariocas.

Mas hoje está diferente, há um silêncio profundo vindo da rua, silencio que só escuto altas horas da noite, e olha que são só dez da noite, mas ficou assim o dia inteiro, ao cair da tarde, apesar de morar de fundos, sempre escuto a sinfonia de buzinas dos cruzamentos próximos da casa, hoje não. Saí para pagar uma conta na loteria no final da tarde, e onde geralmente encontro grandes filas apenas uma moça com um carrinho de bebê.

As ruas estão vazias para o horário, vindo na direção contrária um grupo de estudantes do colégio estadual próximo dali, alguns jovens passam vestindo preto, já acostumei a associar essa vestimenta com aqueles que estão "indo pra guerra" dos protestos, e não são poucos trajados assim, vários, compenetrados, preocupados, a história mais uma vez está nas mãos deles.

Durante todo dia ouvi helicópteros passando sobre o prédio, de vários tipos, dá pra reconhecer pelo barulho que fazem, os mais pesados tem uma batida de hélice diferente, começam a passar cedo, oito da manhã já tinha um reverberando as janelas. Bom dia Vietnã?

Ontem e hoje a imprensa acordou para o que está acontecendo no país, desde segunda feira os protestos ganharam força, em algumas capitais antes disso já haviam incendiado até ônibus, os protestos são contra o aumento das passagens, mas tem mais coisa dentro disso, diria que foi a gota dágua que transbordou o copo.

Nem preciso falar das imagens que estão por toda parte, na imprensa, nas redes sociais, pessoas machucadas, feridas, policiais partindo para cima de manifestantes desarmados, parece que de uma hora para outra a grande imprensa descobriu que ela é tão descartável quanto o povo que apanha nas ruas, pois para o governo não interessa que se noticie os fatos, apenas as verdades que eles inventam para enganar o povo.

E o povo? Esse eterno gado adormecido, o que está fazendo? Foi pra rua protestar, claro, e agora mesmo quem não está participando democraticamente entra no cacete da polícia, orquestração para deixar o povo revoltado ou apenas um bando de psicopatas fardados agindo à revelia do comando da tropa?

As revoluções são dolorosas, deixam vítimas, algumas fatais, às vezes muitas, mas é com sangue que se forma uma nação, claro que aqui poderia ser diferente de tantos lugares onde isso vem acontecendo, mas é sempre assim, quando não vai pelo amor, vai pela dor.

Faltam dois dias para o começo do grande evento, passamos os últimos seis anos "esperando Godot", o grande dia chegou.

Godot chegou e tem fome... muita fome.

Tudo que se falou nos últimos anos está acontecendo, as pessoas foram céticas até agora, conviveram com todas as denúncias, foram ruminando, vendo a cada obra superfaturada ser inaugurada o inversamente proporcional acontecer com os serviços públicos, parece uma coisa orquestrada, mas não, é apenas incompetência de um sistema viciado onde se arrecada muito e se presta pouco serviço a quem pagou.

Isso vai indo, indo, até que um dia explode, e é o que está acontecendo.

Não adianta amanhã o governo dar até tarifa zero na passagem, ele já encheu as medidas, de tudo, está na hora da fila andar.

Se há uma coisa boa nessa história é que agora sabemos que todos eles estão no mesmo saco, no afã de governar sem oposição os governistas fizeram acordo com todos, juntaram do mesmo lado para fazer um reich de mil anos, só que esqueceram de combinar com aqueles que pagam a conta.

Esse governo vai cair, não há dúvida, a base está rachada faz tempo, mas o solo em que se apóia precisa se mexer, esse solo é o povo.

Os próximos dias serão interessantes.

E pensar que tudo começou com uns garotos de preto no Orkut.

Nenhum comentário: