quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Mais um ano que termina

Passaram-se quase dois anos da última postagem nesse blog bissexto que mantenho como registro histórico desta cidade em que nasci, e que jocosamente chamo de "balneário decadente".
Nesse tempo muita coisa mudou, com a cidade outrora maravilhosa e com este que vos escreve.

Com a cidade aconteceu o inevitável (inenarrável?), virou um gigantesco canteiro de obras, coisa que não tem nexo, nem começo, meio ou fim, derrubaram a perimetral, destruiram ruas, avenidas, arvores, casas, o que estivesse no caminho deles, como se um louco todo dia girasse uma roleta aleatoriamente e decidisse o que iriam destruir naquela semana, vivemos um caos diário, empresas de ônibus estão quebrando uma trás da outra, o BRT não dá conta de transportar a população, nem os trens e o metrô, e ainda por cima depois de passarmos um 2014 miserável com a Copa, fiasco do 7X1 (vingança dos jogadores?) e depois a eleição e a reeleição da presidente para um novo mandato, continuamos vivendo na incerteza.

Pensavamos que a coisa ia melhorar, mas não, desde janeiro um bombardeio infernal de crise se abateu sobre o governo e o país, enquanto as investigações da lava-jato começaram a prender gente graúda, não do governo, mas do mundo dos negócios, começaram pelas construtoras, passaram pelos banqueiros e doleiros e terminou com um Senador e algumas eminencias pardas do mundo da política que mostraram sua cara ao mundo pela primeira vez com nome e sobrenome. A coisa piorou, máscaras caíram, me sinto vivendo num mundo irreal onde aqueles vilões caricatos dos filmes de ação se tornarem gente de carne e o osso usando terno e gravata e com pins na lapela para identificar seu grau de importancia na sua sociedade secreta.

O que eu disse num post lá em 2013? Que esse negócio de Copa e Olimpíada ia dar problema, passamos 2013 correndo da polícia, apoiando os índios da Aldeia Maracanã (sempre disse que esse negócio do governo mexer com índio ia dar um azar danado), abraçando o estádio, até mesmo o moribundo autódromo foi alvo de um novo movimento pela construção de um novo cuja minha única contribuição foi tirar o veterano SOS Autódromo RJ do ar para dar espaço para eles, até a faixa velha de guerra foi doada à causa, não que eu não goste mais de automobilismo, mas o momento é outro e eu estou com foco em outras coisas agora.

Foram dois anos meio que fiqueifora do ar, porque a minha vida mudou, arrumei um trabalho diferente de tudo que vinha fazendo até hoje e me dedico a ele porque nele vejo sentido para minha existencia, e principalmente, me ajuda a ver o quão mesquinhos são essas pessoas que governam o país.

Me causou repugnância ver o que aconteceu nas OSCIP´s que administram os hospitais municipais, tirar remédio, salário, insumos dos  para comprar carro de luxo e cavalo de raça, e ainda ter a afronta de desviar material do hospital para tratar os cavalos enquanto os pacientes morrem à mingua?

Não precisa muito, nesses dois anos vimos de tudo, empresas, prefeitos, deputados, senadores, ministros, todos chafurdando na lama do dinheiro fácil, o governo arrecada muito, mas ao contrário do que se diz, ele não gasta mal, ele é roubado o tempo todo, debaixo dos nossos narizes, por pessoas que vão para a mídia se venderem como impolutas e probos quando na verdade estão por baixo dos panos fazendo acordos e mais acordos, tudo para satisfazer suas taras, porque quem desvia dinheiro público não passa de um depravado que não tem respeito pelas pessoas que depositam neles a esperança de receberem um pouco daquilo que são compulsoriamente obrigadas a pagar.

A elite do nosso país, salvo raras, raríssimas exceções, é podre, mesquinha, vil, faltariam adjetivos pra essa gente que só sabe olhar para seu próprio umbigo, os últimos dois anos foram bons para mostrar quem está de que lado, e principalmente, dependia da credibilidade para vender governabilidade, a cada dia que passa as pessoas podem não estar mais politizadas, mas estão mais bem informadas, e a informação é tudo.

Existe o sistema, ele governa nas sombras, não tem nome nem diretor, ele é uma entidade difusa de interesses afins, que mantém o arcabouço de corrupção que parasita o país, ele interessa a muita gente mas ninguém assume a responsabilidade sobre ele, na verdade existem gestores, aqui e ali, com maior ou menor êxito, mantêm a roleta girando e o dinheiro saindo aos borbotões nas cuecas, meias, sapatos, malas, automoveis, aviões. O negócio é roubar, carregar é que o problema.

O delegado Protógenes, que ficou célebre na Operação Satiagraha, que eu considero como o "ground zero" de tudo isso que vem acontecendo no país desde 2004, quando começou a grande paranóia de eventos e obras monumentais para inserir o Brasil no mundo, ele dizia que investigar crime financeiro era simples: "follow the money", dizia, e é verdade, não há crime sem o produto do roubo, sem produto do roubo não há porque roubar, ninguém chega a um cargo de mando sem ter sido empurrado lá pra cima, e pra se chegar lá, dependendo onde for, custa muito dinheiro.

Desde as caravelas se rouba no Brasil, não por gosto ou vocação, mas por uma questão de fé, de que as elites, o patriarcado, os escolhidos, ou seja lá que nome quiserem dar a essa corja, se consideram os únicos capazes de governar e assim tomar a máquina pública pra si.

Esquecem que o sistema corrupto que criaram está montado dentro de um sistema maior, que o sustenta, e que pode destruí-lo, basta haver pessoas capazes e com coragem de fazê-lo.

Há muito que mantenho uma tese de que existe um "inception" dentro do governo, que a mudança de paradigma política tirando a dualidade PSDB X PMDB se infiltrou dentro da máquina, destrinchando os acordos, criando um organograma da corrupção de baixo para cima.

Antes o sistema descartava aqueles que caíam, mas se blindava, de fora se via apenas a pequena parte do iceberg, se protegiam mutuamente, numa malha impenetrável onde quem tinha acesso devia obediência a quem estava acima e esperava pacientemente seu quinhão maior, os que cediam à ambição caiam em esquemas "ladrão de galinhas"  saiam de circulação, mas agora, em vez de pegarem peixinhos estão pegando tubarões, tubarões-baleia.

O sistema está em pânico, a saída foi criar "a crise", mas quem está sufocando o sistema sem o seu sangue (leia-se dinheiro) é o governo, que aos poucos descobre, prende e retoma aquilo que foi roubado, e às vezes solta um ou outro para que, rastreado e vigiado, entregue outros iguais, como foi o caso da gravação feita pelo filho de um dos presos na Lava-Jato que levou à reviravolta política que estamos assistindo agora.

O inception está apenas começando, é como um vírus, vai se espalhando, seguindo o cheiro do dinheiro, do enriquecimento ilícito, da ostentação desmesurada dos funcionários públicos (todos eles, do presidente da república ao faxineiro mais humilde que estão sobre o mesmo estatuto, o são), pegando um a um, mostrando para o sistema, apavorado, que ele terá de abrir mão de uma parte importante de seus lucros para sobreviver, se sobreviver.

Mas cabe aqui uma explicação, quando falo governo não estou falando da administração eleita, é algo mais fundo, uma entidade maior e mais antiga, o sistema, ou pode chamar de República, o grande arcabouço formado pela maioria silenciosa de funcionários públicos que honra o país com seus serviços.

Esses homens e mulheres, servidores dos mais variados escalões, em todos os campos da administração pública, sempre estiveram lá, anos a fio, assistindo o desmonte criminoso da máquina pública, agora, de dentro do sistema, começam a destruir aqueles que montaram seus impérios sobre o dinheiro roubado da sociedade.

É uma idéia difícil de entender para quem vive dentro das brigas partidárias ou das discussões ideológicas, o Estado não tem ideologia, tem leis, e estas devem ser cumpridas, e para isso acontecer, o governo transitório eleito para mandatos de tempo limitado, o executivo, não pode lhe colocar amarras, muito menos o legislativo lhe criar embaraços, os três poderes são autônomos e equânimes, mas somente o judiciário tem o poder de governar de fato, pelo império da lei, e é este que está hoje tentando levar a cabo a maior operação de limpeza do país em toda a história de sua existencia.

Durante a década de 80 e 90 vimos o sistema de investigação federal ser desmantelado, primeiro com o fim da ditadura militar, onde a comunidade de informações, foi dissolvida e boa parte dela atraída e absorvida para o crime organizado os que sobreviveram à transição tiveram que sobreviver também à mingua de recursos e o desprestígio de verem engavetadas suas investigações.

De 2002 pra cá a coisa mudou, silenciosamente, as investigações começaram a acontecer, mas o sistema era forte e as bloqueava, mas à medida que os quadros dentro do serviço público mudavam, e novos servidores entravam, vocacionados pelo espírito público, aos poucos as barreiras foram caindo, e o que antes era a prova de um governo corrupto desnudou um sistema corrupto, O Sistema.

Descobriu-se que a raiz da corrupção remonta a décadas anteriores ao atual governo, ou o atual partido no governo, e que a carapuça que queriam botar em um serviu a todos, desnudando a corrupção a olhos vistos, sem coloração partidária, pura e simples como a luz do dia.

A imprensa, desnorteada como sempre, usou suas velhas táticas de polarização contra o governo no intuito de paralisar as investigações, mas quando mais gritam, mais fundo cravam o punhal no coração do Sistema, paralisando e aturdindo aqueles que antes se achavam intocáveis.

Chega a ser divertido assistir a TV Camara nesses dias, a cara de pânico de uns contrasta com a tranquilidade de outros ao assumirem o microfone da galeria para falar. De dentro eles sabem de tudo, ou quase tudo, que é feito, seja bom ou ruim. Para algumas "excelências" o gosto dos últimos dias de Pompéia está próximo, para outros a certeza tranquila de que conseguiram antes do fim dos seus mandatos assistir a queda de muitos parasitas que entraram para a vida pública para atender seus desejos inconfessáveis de lucro e poder.

O Sistema não vai cair sem luta, vai jogar pesado, vai usar suas armas mais sórdidas para atingir seus objetivos, estamos assistindo uma guerra surda, como um espectador que assistisse de longe os clarões de uma batalha ao anoitecer, mas a guerra está bem perto de nós, ela está entre nós, não me surpreenderei se acontecerem revoltas populares, o Sistema pretende colocar milhares de trabalhadores na rua, os soldados do Sistema estão aí para cumprir ordens, e a ordem agora é parar as investigações a todo o custo, nem que para isso tenha que se jogar o país numa guerra civil para emparedar o governo.

É uma guerra suja, mas numa guerra é importante saber o tamanho do inimigo, durante anos, décadas, sempre imaginei que o sistema era algo sofisticado, intrincado, sem rostos ou nome, um inimigo que não se vê ou não se sabe o seu tamanho é difícil de se enfrentar, mas quando se dá a ele uma dimensão e alcance, nomes e rostos, sabe-se que o inimigo é de carne e osso, e que sangra e morre.

E hoje o que assistimos é a redução desse inimigo a nomes e rostos, e que essas pessoas estão ao alcance do braço da lei, por mais que corram, esperneiem e ameacem, a lei vai alcançá-los, o inimigo incomensurável está sendo retalhado em pedaços, esquemas individuais que formavam o grande arcabouço, aqui e ali, caem, pequenos e grandes, dez milhões, cem milhões, um bilhão, não importa, a cada nome descoberto, a cada sortida da PF para executar mandatos de busca e apreensão, descortina uma parte do grande tapete para onde for varrida a sujeira do país por todos esses anos.

Espero que 2016, mesmo com a Olimpíada, seja um ano bom, para todos nós, ver o Estado fazendo seu trabalho, apesar dos erros do governo, me faz ver claramente que a tática é dar corda para ver o esperto se enforcar, primeiro foram as empreiteiras, agora a saúde, quem será o próximo a cair na armadilha?

Um bom Natal e 2016 para todos meus milhares (mentira...rs) de leitores, não esperem novas postagens tão cedo, isso foi apenas um desabafo, quase pra pontuar o tempo, se tiver algo novo para contar, eu volto, ou não.

Um grande abraço.











Nenhum comentário: